Divagações: Southpaw
8.9.15
Afinal de contas, qual é o valor da originalidade no cinema? Ainda que essa pergunta pareça excessivamente filosófica, é impossível deixar de perguntar este tipo de questão após ver a recepção crítica que Southpaw vem recebendo. Decerto nem todos conseguem (ou até mesmo querem) inovar o tempo todo, porém, é de se pensar em quanto um filme mediano pode se tornar um clássico unicamente por ter sido especialmente original ou quanto um filme que é tecnicamente excepcional pode ser esquecido por requentar as mesmas ideias de sempre.
Essa sensação de cansaço é ainda mais evidente em gêneros que tradicionalmente não são o palco para grandes inovações e experimentações artísticas, o que os leva a acumular uma dose generosa de clichês e artifícios narrativos ao longo do tempo. Como grande exemplo temos os dramas esportivos, que durante toda a história do cinema foram relegados quase que integralmente a dois grandes enredos igualmente batidos: por um lado temos o filme sobre um azarão que contra todas as chances chega ao topo; do outro, a história do campeão que cai de suas graças até o fundo do poço e de lá precisa se levantar para voltar aos holofotes.
Enfim, Southpaw não faz questão de esconder que faz parte do segundo grande grupo. No início de filme, Billy Hope (Jake Gyllenhaal) parece ser um boxeador imbatível, com uma história inspiradora para contar, dezenas de nocautes no currículo, milhões na conta e uma linda família composta por sua esposa Maureen (Rachel McAdams) e por sua filha Leila (Oona Laurence). Porém, não há como termos um filme sem conflito, não é? Assim, em uma reviravolta extremamente previsível, o atleta sofre um acidente trágico que o faz perder sua carreira, seu dinheiro e até mesmo seus entes queridos, forçando Billy a repensar suas escolhas de vida e buscar a ajuda de Tick Wills (Forest Whitaker), um treinador aposentado e amargurado, para juntar os cacos de sua vida.
Não é difícil ver que todos os clichês do gênero estão representados em Southpaw, transformando o filme em uma salada de elementos extremamente pouco inspirados e que adicionam muito pouco ao resultado final. Temos de tudo, um protagonista nervosinho e autodestrutivo cujo arco dramático relaciona a superação das suas dificuldades afetivas a sua performance esportiva, um mentor angustiado pelos erros do passado que reluta em ensinar o protagonista, mas que acaba servindo como uma figura paterna, agentes inescrupulosos e gananciosos, estereótipos raciais e até mesmo a onipresente montagem musical de treinamento.
É preciso admitir que a direção de Antoine Fuqua é bacana e tenta – ainda que sem muito sucesso –, trazer alguma profundidade a estes elementos e a interpretação de Gyllenhaal vende muito bem o personagem (ele e Whitaker são os únicos destaques do elenco). Ainda assim, nada é especialmente digno de nota ou merecedor de atenção.
Não há frescor ou uma real intenção de trazer algo de realmente poderoso ou genuinamente emocional, apelando para clichês e saídas fáceis para envolver o público, o que certamente pode funcionar para algumas pessoas, mas que soa extremamente condescendente para qualquer um com mais contato com esse tipo de história. Isso fica particularmente claro para quem percebe o quanto o filme joga seguro, evitando algumas decisões mais corajosas de roteiro que poderiam torná-lo bem mais interessante e consistente, falhando em coisas que muitos outros filmes bem anteriores já arriscaram em fazer.
Dito isso, sinceramente não compreendo o motivo dos elogios dirigidos a Southpaw. Admito que não há algum defeito particularmente gritante e que talvez ele entregue justamente o que prometeu, mas acaba por aí. O que sobra é uma história derivativa e pouco inspirada que talvez funcionasse quarenta anos atrás, mas que hoje em dia não se sustenta por si só, ficando bem atrás de outros filmes recente do gênero como The Fighter e Warrior.
Pode-se dizer, então, que apesar de não sofrer um nocaute, certamente essa é uma derrota técnica – ainda que se prove como um entretenimento competente, Southpaw dificilmente será o tipo de filme que sobrevive ao teste do tempo.
Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle
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