Divagações: War Dogs

Quando você pensa em um filme de Todd Phillips , o homem por trás de The Hangover , o que vem à mente é uma comédia exagerada e nonsense. ...

Quando você pensa em um filme de Todd Phillips, o homem por trás de The Hangover, o que vem à mente é uma comédia exagerada e nonsense. Nesse contexto, uma história ‘baseada em fatos reais’ sobre o comércio internacional de armas é, no mínimo, uma decisão curiosa. Tudo bem que o filme trata de dois jovens emaconhados de Miami se tornando milionários da noite para o dia nas costas da política bélica dos Estados Unidos, mas existe um limite de até onde esse tipo de assunto dá margem para piadas. Ou seja, sempre existe o risco de uma comédia assim desandar.

Passando-se no auge da ‘guerra ao terror’ do governo Bush, War Dogs trata da parceria entre David Packouz (Miles Teller) e Efraim Diveroli (Jonah Hill). Enquanto David é um massagista inseguro preso em um negócio que não decola, Efraim é desbocado, agressivo e quase beirando a psicopatia. Amigos de infância, os dois se reencontram depois de anos separados e Efraim acaba oferecendo a David um emprego em sua empresa, que vive atendendo a pequenas licitações de armas feitas pelo governo americano. Com o trabalho dos dois e um pouco mais de sorte do que de juízo, a empresa prospera e, logo, a dupla se vê às voltas com gangsteres do leste-europeu, contrabandistas inescrupulosos e traficantes internacionais de armas, como Henry Girard (Bradley Cooper), em um negócio que pode ser muito maior do que eles são capazes de lidar.

Ao contrário do que alguns possam pensar, War Dogs não é exatamente uma comédia divertida sobre dois caras se aventurando em um negócio arriscado. Na verdade, é algo mais na veia de The Wolf of Wall Street, com a graça justamente do exagero desses protagonistas em face ao sistema. Sem tantas piadas, a comédia vem das situações absurdas em que eles se metem na busca pelo sucesso. Mas é preciso observar que, nesse caso, há uma boa dose de licença poética, já que muita coisa aparentemente aconteceu de modo um bem diferente na vida real – enfim, tudo para tornar o filme mais atrativo.

Não que War Dogs seja sério, mas as coisas certamente se tornam mais sombrias com o tempo, tratando mais da ganância, da inconsequência e de até onde uma pessoa pode ir. Os paralelos com Scarface que o filme mesmo traz são inevitáveis, ainda mais quando a ascensão rápida dos protagonistas é regada a drogas, fraudes e violência. Só não sei se essa faceta mais séria da obra – e que talvez seja a mais interessante – combina com a maneira com o filme é vendido. Com uma fotografia colorida e músicas animadas, isso pode gerar alguns atritos entre expectativas e a realidade.

De qualquer modo, a química de Miles Teller e Jonah Hill funciona bem, ainda que esse esteja longe de ser o melhor filme de ambos. Teller é mais contido, mas serve para mostrar o lado mais real e palpável da história, sendo interessante ver como o personagem muda de forma orgânica no decorrer do filme. Jonah Hill, por outro lado, traz aquele personagem que é fácil de odiar: bonachão, mas com um fundo meio sinistro de quem pode explodir a qualquer momento. Essa dinâmica só funciona por conta do roteiro, que tem uma boa dose de ironia e deboche, dando espaço para os atores.

Infelizmente, a produção tem algumas falhas perceptíveis, como a dissonância do visual e da narrativa, a mensagem dúbia até a maneira derivativa de contar a trama, faltando traços mais fortes de personalidade. Sinto que, em pleno 2016, usar uma narração expositiva do protagonista para pontuar a história é um recurso batido e que deve ser usado com parcimônia. Nesse caso, ela se torna um elemento estranho, que não acrescenta nada e só serve para emburrecer o produto final.

War Dogs não faz nada de muito original e está em um ponto complicado entre dois gêneros distintos, mas é um filme sólido e até mesmo educativo, já que consegue dar uma visão bem didática sobre o negócio bélico nos Estados Unidos das últimas décadas. Se a descrição pareceu interessante ou se você gosta de filmes sobre traficantes em Miami – algo meio fora de moda desde os anos 1980 –, talvez valha a pena dar uma chance. Mas o longa-metragem está longe de ser imperdível: tudo o que ele faz, outros filmes já fizeram melhor.

Outras divagações:
The Hangover
Due Date
The Hangover Part II
The Hangover Part III

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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