Divagações: Lady Bird
13.2.18
Histórias sobre amadurecimento e sobre relações interpessoais entre pais e filhos não são exatamente novidade. Pelo menos em um nível superficial, Lady Bird dá a impressão de ser algo que já vimos por aí muitas e muitas vezes. Então, quais são os méritos que tornam o filme escrito e dirigido por Greta Gerwig digno de elogios e de um destaque nessa temporada de premiações?
Depois dos elogios da crítica lá fora, talvez minhas expectativas para este filme estivessem um pouco distorcidas. Fui ao cinema justamente para descobrir o que torna Lady Bird algo especial, mas apenas descobri que, curiosamente, não há nada. Isso, para minha surpresa, porém, também não torna o filme menos interessante.
Passado em Sacramento, na Califórnia, no início dos anos 2000, Lady Bird acompanha Christine McPherson (Saoirse Ronan), uma adolescente que se autodenomina "Lady Bird" e que quer desesperadamente sair da sua cidadezinha conservadora para algum lugar "que tenha cultura". Em seu último ano no Ensino Médio, ela tem que lidar com problemas com os pais – sobretudo com a mãe, a superprotetora Marion (Laurie Metcalf), com a qual ela nutre uma relação nem sempre amistosa –, com a escola, com os amigos, com relacionamentos e com a escolha da faculdade.
A princípio, como já mencionei, histórias sobre jovens ambiciosos que se sentem sufocados pela pressão de uma vida mundana e tem a aspiração de vivenciar o mundo não são raras. Lady Bird é um exemplo muito claro desse mesmo arquétipo. Christine é aquela menina que sonha com uma vida em Nova York, com um namorado interessante e que fundamentalmente começa o filme como alguém completamente autocentrada e um bastante cega às lutas e dificuldades das pessoas ao seu redor – ou seja, uma típica adolescente.
A jornada de crescimento da protagonista, onde ela precisa fazer as pazes com suas origens, transcorre exatamente da maneira que todos esperam. Existe pouco no filme que não seja previsível. No percurso, ela cruza com uma gama de personagens que podem ser sintetizados dentro de limites muito familiares – a amiga impopular, mas legal (Beanie Feldstein); a menina bonita, popular e superficial (Odeya Rush); o primeiro namorado (Lucas Hedges); o cara claramente babaca (Timothée Chalamet); a professora durona, mas atenciosa (Lois Smith). Ainda que não se limitem a estereótipos, eles certamente fazem parte deles.
Com isso, o resultado final poderia ser algo bastante desinteressante. Mas esses conceitos e personagens familiares são executados de uma maneira bastante competente. Lady Bird é muito eficiente em colocar as coisas dentro de uma naturalidade que é pouco vista no cinema, sendo que a maneira como o filme é editado e dirigido dá uma sensação muito forte de "vida real". Assim, apesar das situações não fugirem muito de um lugar comum, há o núcleo necessário para que o roteiro funcione a um nível emocional, contanto que você não analise demais a profundidade dos dramas expostos.
O ponto mais interessante do filme certamente está na relação entre Christine e sua mãe. Com boas atuações das duas atrizes, temos o retrato de uma relação conturbada, mas com uma boa tridimensionalidade, em que as motivações de ambas as personagens são justificadas e compreensíveis, mesmo que se mantenham em um constante e inevitável conflito. Laurie Metcalf e Saoirse Ronan têm uma excelente química em tela e entregam essa ambivalência de uma relação familiar que vai do ódio ao amor em questão de segundos. Certamente, a identificação com ambas e o lado para o qual cada espectador vai pender nesse cabo de guerra afetivo depende muito da vivência de cada um, mas já é um mérito enquadrar essas situações sem que haja um vencedor claro. Resta a quem vê que tire suas próprias conclusões.
Lady Bird é um filme sensível e engraçado que aborda bem os seus assuntos, mesmo às vezes carregando um pouco a mão na quantidade de temas que quer tratar ou mencionar. Ele não é exatamente original ou revolucionário, mas funciona pela força das suas atuações e porque cumpre o que se propõe a fazer. Mesmo que no fundo eu esperasse mais, o longa-metragem é perfeitamente competente e faz o que os melhores coming of age são capazes, que é transportar quem assiste para sua própria juventude e para aqueles dramas passados (ou presentes!).
Mesmo que esse não seja exatamente o meu tipo de filme, não tenho dúvida de que existe um público que irá se identificar fortemente com essa jornada de amadurecimento. Isso já é o bastante para que Lady Bird mereça ser visto.
Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle
Depois dos elogios da crítica lá fora, talvez minhas expectativas para este filme estivessem um pouco distorcidas. Fui ao cinema justamente para descobrir o que torna Lady Bird algo especial, mas apenas descobri que, curiosamente, não há nada. Isso, para minha surpresa, porém, também não torna o filme menos interessante.
Passado em Sacramento, na Califórnia, no início dos anos 2000, Lady Bird acompanha Christine McPherson (Saoirse Ronan), uma adolescente que se autodenomina "Lady Bird" e que quer desesperadamente sair da sua cidadezinha conservadora para algum lugar "que tenha cultura". Em seu último ano no Ensino Médio, ela tem que lidar com problemas com os pais – sobretudo com a mãe, a superprotetora Marion (Laurie Metcalf), com a qual ela nutre uma relação nem sempre amistosa –, com a escola, com os amigos, com relacionamentos e com a escolha da faculdade.
A princípio, como já mencionei, histórias sobre jovens ambiciosos que se sentem sufocados pela pressão de uma vida mundana e tem a aspiração de vivenciar o mundo não são raras. Lady Bird é um exemplo muito claro desse mesmo arquétipo. Christine é aquela menina que sonha com uma vida em Nova York, com um namorado interessante e que fundamentalmente começa o filme como alguém completamente autocentrada e um bastante cega às lutas e dificuldades das pessoas ao seu redor – ou seja, uma típica adolescente.
A jornada de crescimento da protagonista, onde ela precisa fazer as pazes com suas origens, transcorre exatamente da maneira que todos esperam. Existe pouco no filme que não seja previsível. No percurso, ela cruza com uma gama de personagens que podem ser sintetizados dentro de limites muito familiares – a amiga impopular, mas legal (Beanie Feldstein); a menina bonita, popular e superficial (Odeya Rush); o primeiro namorado (Lucas Hedges); o cara claramente babaca (Timothée Chalamet); a professora durona, mas atenciosa (Lois Smith). Ainda que não se limitem a estereótipos, eles certamente fazem parte deles.
Com isso, o resultado final poderia ser algo bastante desinteressante. Mas esses conceitos e personagens familiares são executados de uma maneira bastante competente. Lady Bird é muito eficiente em colocar as coisas dentro de uma naturalidade que é pouco vista no cinema, sendo que a maneira como o filme é editado e dirigido dá uma sensação muito forte de "vida real". Assim, apesar das situações não fugirem muito de um lugar comum, há o núcleo necessário para que o roteiro funcione a um nível emocional, contanto que você não analise demais a profundidade dos dramas expostos.
O ponto mais interessante do filme certamente está na relação entre Christine e sua mãe. Com boas atuações das duas atrizes, temos o retrato de uma relação conturbada, mas com uma boa tridimensionalidade, em que as motivações de ambas as personagens são justificadas e compreensíveis, mesmo que se mantenham em um constante e inevitável conflito. Laurie Metcalf e Saoirse Ronan têm uma excelente química em tela e entregam essa ambivalência de uma relação familiar que vai do ódio ao amor em questão de segundos. Certamente, a identificação com ambas e o lado para o qual cada espectador vai pender nesse cabo de guerra afetivo depende muito da vivência de cada um, mas já é um mérito enquadrar essas situações sem que haja um vencedor claro. Resta a quem vê que tire suas próprias conclusões.
Lady Bird é um filme sensível e engraçado que aborda bem os seus assuntos, mesmo às vezes carregando um pouco a mão na quantidade de temas que quer tratar ou mencionar. Ele não é exatamente original ou revolucionário, mas funciona pela força das suas atuações e porque cumpre o que se propõe a fazer. Mesmo que no fundo eu esperasse mais, o longa-metragem é perfeitamente competente e faz o que os melhores coming of age são capazes, que é transportar quem assiste para sua própria juventude e para aqueles dramas passados (ou presentes!).
Mesmo que esse não seja exatamente o meu tipo de filme, não tenho dúvida de que existe um público que irá se identificar fortemente com essa jornada de amadurecimento. Isso já é o bastante para que Lady Bird mereça ser visto.
Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle
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