Divagações: Big Eyes

Não há como negar que Tim Burton já saiu das graças dos críticos e do público há algum tempo. Depois do insosso, porém bem sucedido, Ali...

Não há como negar que Tim Burton já saiu das graças dos críticos e do público há algum tempo. Depois do insosso, porém bem sucedido, Alice in Wonderland e do medíocre Dark Shadows, já estava na hora do diretor se reinventar. Nem que isso implique justamente em deixar um pouco de lado o estilo e a estética que o consagrou de forma a entregar um produto mais palatável para todas as audiências.

Baseado em uma história real, Big Eyes acompanha a vida de Margaret Ulbrich (Amy Adams), uma aspirante a artista que em plenos anos 1950 abandona um casamento opressivo e tenta reconstruir a vida em San Francisco. Seu estilo único acaba chamando atenção de Walter Keane (Christoph Waltz), um carismático e charmoso pintor de rua. Após um breve relacionamento, os dois acabam se casando e decidem produzir em conjunto, porém, alimentado pelo ego e por uma série de mal entendidos, Walter acaba por assumir a autoria das obras mais icônicas de Margaret, as crianças de olhos grandes, levando a artista a se questionar sobre o preço a se pagar pelo sucesso.

A atmosfera do filme é um pouco esquisita, não decidindo muito se abraça o drama de um conflito pessoal ou a comédia de uma farsa. Isso gera alguns contrastes meio estranhos, tratando situações teoricamente um pouco pesadas de modo meio leviano, exagerando em situações que nem de longe são tão dramáticas ou tingindo algumas cenas mais cômicas com um tom sombrio desnecessário.

Essa dualidade é expressa nas atuações dos dois protagonistas. Amy Adams se esforça para entregar uma personagem atormentada pelas suas mentiras e pela insatisfação com a própria sociedade a sua volta. Já Christoph Waltz é seu exato oposto, um sujeito passional que passa da simpatia para a violência com a mesma facilidade que acredita em suas próprias histórias fantásticas. Porém, ainda que o par funcione bem e consiga dar o contraste certamente desejado pela direção, sinto que ambos passam dos limites ocasionalmente, tornando Margaret uma personagem apática demais, do mesmo modo que não raras vezes Walter se torna uma caricatura de si mesmo.

Assolado por um mal que aflige diversas outras cinebiografias, Big Eyes também tem alguns problemas de ritmo. O filme às vezes omite passagens que poderiam ser melhores exploradas, às vezes adiciona cenas que pouco acrescentam para a história. Mas, apesar de algumas irregularidades – sobretudo na metade final do filme, que parece comprimir mais de uma década em pouco mais de meia hora –, no geral, a dinâmica se mantém, fazendo com que esse seja um filme agradável e perfeitamente capaz de manter o espectador interessado.

Com boas atuações e uma premissa interessante para quem gosta de arte, Big Eyes acaba se mostrando como um filme sólido, porém, sem brilhantismo ou qualquer grande surpresa. O fato de se basear em uma história real funciona como uma faca de dois gumes, afastando Burton dos lugares comuns e dos elementos já batidos de suas obras, mas retirando boa parte de sua individualidade, ainda mais se compararmos com outra meia dúzia de filmes similares que estão sendo lançados recentemente. Assim, uma pitada extra de tempero ajudaria a produzir uma mistura mais interessante e capaz de se destacar nesta concorrida temporada de premiações.

Outras divagações:

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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