Divagações: Unbroken
15.1.15
É estranho quando um filme começa e você tem a sensação de que algo está errado. Os meninos estão no avião, fazendo o trabalho deles para defender um país, uma causa. Eles são jovens, mas foram treinados. A guerra é assim. Tiros, explosões, mortes, imprevistos. Está tudo aparentemente certo com Unbroken, mas falta um coração pulsante, uma revolta, uma juventude, uma vontade de viver. O filme deveria ser sobre isso, ou não?
Baseada no livro de Laura Hillenbrand, a produção faz questão de frisar que conta uma história real. Louis ‘Zamp’ Zamperini (Jack O'Connell) é um jovem corredor ítalo-estadunidense que fez sua primeira participação em Olimpíadas na Alemanha, em 1936. Ele espera ser o grande nome de seu país na próxima competição, mas acaba chegando ao Japão de outra forma – como prisioneiro de guerra após um naufrágio. Pode-se dizer que ele é tratado como tal, mas parece que Watanabe (Takamasa Ishihara) criou uma predileção em maltratar o talento enviado na forma de soldado inimigo.
Quase todo o tempo ao lado de seu companheiro Phil (Domhnall Gleeson), Zamp não parece saber exatamente o porquê de estar lutando. Sua mãe não fala inglês e sua infância foi marcada pela origem italiana. Assim, sua silenciosa resistência às agruras do naufrágio e às crueldades do campo de prisioneiros parece muito mais com uma teimosia que com heroísmo. Será que essa é realmente a história real? Será que é isso mesmo que eu deveria estar assistindo?
Unbroken não é sobre lutar, mas sobre aguentar, simplesmente continuar, ainda que sem muita certeza sobre o objetivo final. Vale a pena viver se o preço for a própria sanidade? Os personagens chegam a se questionar e tentam manter a mente alerta, mas é difícil. O detalhe é que, seguindo a história real, essa poderia ser uma trama de redenção e amor a Deus, mas o texto parece tocar esses pontos apenas tangencialmente – ainda que com certa frequência – para que ninguém saia ofendido ou se questione demais sobre os objetivos do protagonista.
Aliás, parece que há mais a esconder. Dirigido por Angelina Jolie, o filme continua a trajetória da atriz nessa nova carreira de forma sólida e discreta. O nome dela aparece ao final e deve surpreender boa parte do público desavisado. Sem personagens femininas fortes ou qualquer temática normalmente relacionada a Angelina, a produção explora a total falta de objetivos da guerra quando resolve simplesmente não explicá-la. Não há um contexto para o conflito ou o ódio entre nações. É uma situação maior que os personagens e totalmente independente deles. São meninos bobos. Todos eles. Principalmente o protagonista.
Há também certo gosto agridoce em Unbroken. É o antagonista japonês que tem problemas familiares, assuntos a resolver e uma imensa raiva dentro de si. É ele que gosta de gritar, tem vontade de lutar e vencer, quer se tornar mais do que é. Ao mesmo tempo, o representante dos Estados Unidos suporta com firmeza tudo o que consegue, é justo, incorruptível e não questiona ordens. Parece que os papéis foram trocados e a frieza venceu a juventude. Ou será que estou enxergando coisas?
Unbroken é incômodo porque ele faz exatamente tudo o que deveria fazer, mas há uma nota dissonante. Talvez o objetivo seja criar um subtexto ou talvez simplesmente haja algo errado. De minha parte, eu só queria menos profissionalismo e mais adrenalina naquela primeira cena. O tom de todo o resto seria diferente.
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